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sábado, outubro 24, 2015

Tempo a dois e filhos pequenos

De manhã, algures entre o ballet, a ginástica e a praça (adoro ir à praça), ouvi na rádio alguém, não faço ideia quem seria, a falar sobre o tempo a dois dos casais com filhos pequenos. Não estava com muita atenção, a algazarra no carro não dá para grandes concentrações, mas lembrei-me de vos escrever sobre a minha experiencia com isto da maternidade e do tempo a dois.
Quando nasceu a minha primeira filha, Migalha Crescida, desapareci para o mundo. Desapareci enquanto mulher. Com as dores de parto, com a força da expulsão, com o alívio da epidural, algures num quarto de hospital, a Xaxia desapareceu para se tornar Mãe.
Ninguém me tinha avisado sobre este perigo, o de ser engolida por três quilos de gente, mas talvez não tivesse sido muito diferente se o tivessem feito, quando peguei a miúda nos braços fui invadida de um amor tão grande, tão arrebatador e tão desconcertante, que nem sabia muito bem o que fazer com ele. Queria unicamente olhar para ela, enroscá-la nos meus braços, levá-la para a minha cama, cheirá-la noite e dia.
O homem da casa, deixou de ser homem, e tornou-se aos meus olhos, pai. Só pai. Estava ali para o que fosse preciso. Chega-me o lençol de banho. Liga o esterelizador. Vai comprar fraldas.
Juntos, e do meu exclusivo ponto de vista, passámos a ter como única missão na vida, adorar uma criança que de repente ocupou todo o espaço da minha cabeça e do meu coração.
Eu não tinha tempo para ele. Aliás, eu não tinha tempo para mim.
O cabelo era preso de qualquer maneira num rabo de cavalo. Todos os dias. Porque era rápido. E prático. Não exigia escovas nem secadores. A roupa era confortável. Escolhida sem empenho Saltos altos, nem pensar. Bijuterias, nem pensar. Ainda a menina me engolia algum brinco, credo. Não tinha tempo para arranjar as mãos, para fazer a depilação, para me maquilhar. Mas não era preciso, para quê lá isso de estar bonita, se tinha virado uma espécie de mulher assexuada com reserva exclusiva para a miúda?
Não me lembro quanto tempo durou isto. Sei que olho para as fotos da minha filha bebé e não reconheço aquela gorda canastrona que a segura nos braços.
Dito-Cujo foi paciente. Habituou-se a chegar à cama e ter a cama vazia, ou uma mulher a dormir, ou uma bebé no lugar dele.
Não é nada de admirar que ocorram tantos divórcios entre casais acabadinhos de ser pais. Há mulheres ainda piores que eu, que quase sentem que traem os filhos por darem atenção aos maridos.
Por isso se torna quase irónico as pessoas que decidem enfiar bebés no meio de relações frágeis. Não dá amigos, simplesmente não dá. Ou aquela merda tem alicerces decentes, ou vai tudo pelo cano abaixo.
Não sei dizer com exactidão quando a coisa se inverteu. Mas sei que é muito fácil e muito rápido degradar uma relação se cedermos aos constantes apelos do nosso coração de mãe e de hormonas egoístas.
Com os outros filhos já não foi assim. Curiosamente, apesar do trabalho e da exigência se terem tornado muito maiores, ganhei muito tempo. Aprendi a soltar-me, e a soltá-los. Sem pesos na consciência.
Hoje, conseguimos encontrar com muita frequência brechas nos espartilhos da vida familiar que preenchemos com tempo só nosso. Tenho a certeza que é este tempo, curto mas de qualidade e que passamos sozinhos, que nos ajuda a levar o barco para a frente. Claro que ajuda ter com quem os deixar. Claro que ajuda saber que estão muito bem entregues e muito bem cuidados.
Minha gente, mães de primeira viagem, nem todos os homens têm a pachorra que o meu teve. Nem todas as mulheres percebem a tempo que aquela imagem que o espelho lhes devolve já nem é delas.
Não há melhor coisa que possamos oferecer às criancinhas que uma família feliz.

5 comentários:

  1. Caramba Xaxia!
    Que grande alerta!
    Eu fui uma dessas mães de primeira (e infelizmente única) viagem. E durante 3 anos(!!!) esqueci-me de mim e do meu casamento. Eu não era mulher de ninguém, eu era só Mãe! Não pode...

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  2. Completamente de acordo! Não passei por essa fase de encantamento exclusivo, até porque tive sempre muito medo que o meu marido não tivesse essa paciência! Hoje tenho a certeza que ele teria, mas na altura muitas dúvidas existiam. E faz-me imensa confusão as mulheres que entram nessa espiral de dedicação ao bebé, de "ostracização" dos maridos, e não conseguem acordar desse torpor! Sim, acho que isso é um torpor! Infelizmente, muitas vezes as histórias não têm finais felizes. Felizmente, a sua teve! :)

    bj

    Carla

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