Hoje, enquanto procurava um envelope numa gaveta, encontrei um postal da minha avó. Um postal que não me lembro de ter visto, nem de ter lido. Um postal que fala de amizade, de desencontros, de como sou importante para ela, de como o passado não importa, apenas os nossos sonhos. As crianças, sempre as crianças. A minha avó adorava os meus filhos.
O postal só pode ter sido escrito num qualquer aniversário, e vinha de certeza acompanhado de dinheiro que guardei, sem sequer o ter lido. E o postal tinha uma mensagem, e eu não sei de quando é, porque nem sequer tem data, e de certeza que foi escrito à espera de uma qualquer reacção, por muito simples, que não tive, porque o ignorei, como ignoramos quase todas as coisas que temos como certas na vida.
Talvez tivesse que ser assim. Talvez aquele postal tenha hoje uma importância que não teria tido na altura, porque naquele dia em que me foi entregue, nem sequer sonhava a falta que me ia fazer, não sonhava as saudades que ia ter. Não podia imaginar que não passasse um dia sem que me lembrasse dela.
Mas está a ser dificil pensar que me abriu o seu coração daquela forma, com uma mensagem tão clara, (ela que tinha tanta dificuldade com essas coisas da clareza de pensamentos) e que eu o ignorei.
E por isso estou num misto de alegria, porque o encontrei e porque escolheu aquele postal e escreveu aquelas palavras, mas muito triste, em frangalhos, por não o ter lido à sua frente quando mo entregou. De não lhe ter dado um abraço gigante. De não lhe ter dito que a adorava. Que ela também era muito importante para mim.
Posso dizê-lo agora, e digo-o mil vezes. Mas não sei se me ouve. Também o disse muitas vezes quando estava doente, e até morrer. Mas nem aí tenho a certeza que me tenha ouvido, ou compreendido, trancada naquele corpo inerte com um cérebro inundado de hemorragias.
Talvez isto tudo seja uma grande lição. Talvez venha a ser.
Hoje está a ser só incrivelmente doloroso.
Há sempre qualquer coisa que fica / ficou por dizer.
ResponderEliminarO que verdadeiramente importa é o amor, o carinho, as acções que se praticaram. Força!
Eu sei que as acções contam mais... Mas talvez se deva dizer. Especialmente as coisas que valorizamos. Normalmente abrimos a boca para dizer o que está mal, nunca o que gostamos.
EliminarCaramba, andei o dia todo à espera de ter um bocadinho livre para ler este post sem pressa.
ResponderEliminarUm beijinho
Muito obrigada.
EliminarGrande beijinho.
Schiu Xaxia, não estejas triste…
ResponderEliminarPensa só, e se ela quisesse que tivesse sido assim mesmo? Se ela soubesse e quisesse que um dia mais tarde tu encontrasses o postal e o lesses? Se ela, as avós são infinitamente sábias, soubesse que naquele momento não ligarias à mensagem escrita mas que um dia ela te faria todo o sentido? Se ela quisesse estar presente e ser palavra no teu futuro? Pensa só Xaxia.
Eu não sou avó, e muito menos sábia mas sei que um dia não vou estar cá para dizer ao meu filho coisas que quero que ele saiba, coisas que não quero que ele esqueça, e por isso aqui e ali, escondido dentro de livros ou entalados nas estantes, ou mesmo colados num albúm de fotos vou deixando bilhetinhos com mensagens que sei que ele um dia encontrará; confio no tempo (no destino?) para que ele os encontre no tempo certo, quando lhe forem mais úteis. Pensa só Xaxia, e se…?
Gosto de pensar nisso, que nada acontece por acaso. Que tive de o encontrar e ler hoje, porque era hoje que aquelas palavras fariam mais sentido. E até fazem.
EliminarEssa coisa dos bilhetinhos comoveu-me às lágrimas.
Beijinhos
Espero que sim, espero mesmo que sim. Mas imagino a tristeza que sentiu quando ignorei as palavras que me escreveu. E agora é tarde.
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