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sexta-feira, novembro 28, 2014

Parece que é para falar do Natal

A minha avó tinha uma pobre.
Sério.
Não sei como começou aquilo. Sei que a Senhora Maria era uma das muitas pessoas que corriam os prédios a pedir esmola de porta em porta. E que a certa altura a minha avó deixou de lhe dar uma moeda, para passar a dar-lhe um prato de comida e mais algumas coisas.
Também não sei como passou a Senhora Maria do degrau das escadas onde comeu as primeiras vezes, para a cozinha da minha avó.
Era muito gorda. Eu tinha dificuldade em perceber como uma mulher tão gorda, podia ter fome, mas a minha avó explicou-me que era "da doença".
E a Senhora Maria cheirava muito mal. Tão, mas tão mal. No dia em que entrava e se sentava a comer na mesa da cozinha, era ver a minha avó a abrir janelas, a usar sprays, a desinfectar a louça, a mesa e a cadeira, gastava bem um frasco de álcool a apagar os vestígios da passagem da Senhora Maria.
Aliás, acho que me lembro bem da Senhora Maria, porque fugíamos a sete pés dela, e nem à porta da cozinha chegávamos enquanto durava o almoço, tal era o cheirete.
Vivia numa barraca, sem água, e sem luz, coisa não tão estranha há trinta anos, o que não faltavam eram bairros inteiros de barracas cheios de Senhoras Marias, e a minha avó aguentava estoicamente na cozinha enquanto durava a refeição, mas lá a banheira nunca ofereceu, acho que seria demais, até para a minha avó.
Bom...Acabei de abrir a porta a uma pessoa que à pergunta "quem é", respondeu, "eu". Instintivamente à resposta "eu", abri a porta sem pensar. Dei de caras com uma mulher menos gorda, menos mal cheirosa, mas que como a Senhora Maria, também pediu "qualquer coisinha para ajudar".
E seguramente há mais de dez, quinze anos, que não me batiam à porta a pedir, afinal nos dias que correm ninguém abre a porta a ninguém desconhecido, já se sabe que atrás da mulher com o ar inocente está um galifão que nos vai dar com uma marreta na cabeça e entrar-nos casa dentro, roubar-nos o i-phone, o portátil e as jóias...Apanhada desprevenida e de surpresa, com pressa de fechar a porta antes que o gang escondido me saltasse em cima, respondi às pressas e a medo "não tenho".
Atrás desta mulher não estava ninguém. Só humildade, e quem sabe a vergonha de ser encontrada a pedir na rua.
E agora espero que volte.

15 comentários:

  1. Pipocante Irrelevante Delirantesexta-feira, 28 novembro, 2014

    A casa, nem os Jeovas... agora é só m##, n0s, Vo___ne, e companhia. Também estes são uma espécie de mendigos, ainda que diferentes.

    Mas ainda me lembro das senhoras que iam bater à porta da minha mãe, com petizes pela mão. Algumas aceitavam pão, outras apenas dinheiro na mão.

    De dar esmola, posso dizer que não... quem ande de transportes, sabe que, dando uma moeda a cada um com que se encontra, ia o salário ao fim de uma semana.

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    1. Não ando de transportes, mas o caminho para o café ao Sábado de manhã é bastante exemplificativo do que se passa.
      Dou todos os domingos à porta da igreja. De quando em vez compro a Cais. Difícil explicar aos miúdos porque não dou a toda a gente...

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  2. Há uns meses tb me tocou à campainha uma senhora a pedir. Durante uns segundo acho que fiquei atônita, mas depois lá lhe disse que dinheiro não dava e acabou por levar uns pacotes de leite

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    1. Quem tem mesmo necessidade aceita tudo, mas deve ser horrível não poder escolher o que se come...miséria...

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  3. No próximo FDS vai haver recolha de bens alimentares nos supermercados.

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    1. Tenho uma opinião sobre a forma como o banco alimentar se organiza na ajuda a quem precisa, mas ainda assim muito melhor, incomparavelmente melhor, do que não haver nada.

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    2. xaxia pois eu conheço bem quem não precisa e recebe ajudas alimentares à anos - uns 10 - continuando com o estilo de vida, carrões novos todos os anos e vivem em casas bem caras... por isso, só dou directamente a quem precisa jamais atraves de qualquer instituição.

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    3. Eu conheço quem não dá vazão ao que recebe e distribui por quem não precisa...

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    4. Também conheço pessoas que dão aquilo que não chegam a conseguir consumir dentro da validade. Por outro lado, conheço muitos casos de pessoas que vão buscar bens ao banco alimentar de carros de gama alta. É uma vergonha. Deixam o carro um pouco antes e lá vão eles. Juro que sinto vergonha dessa gente que tem dinheiro que quem dera à maioria dos portugueses, mas têm-no à custa de comportamentos destes. Da mesma forma que conheço casos de quem nem deixa o carro a uns metros de distância, porque agem em conluio com os voluntários.

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  4. É horrível, à porta nunca me bateram, mas sou abordada tantas vezes no transito ou perto de cafés que muitas vezes já nem olho antes de dizer "não". 99% das vezes são drogados ou romenos mas, há pouco tempo disse não e quando me voltei era um senhor de uns sessenta anos, bem vestido. Ia morrendo de vergonha e desfiz-me em desculpas, só queria comer... A vida, às vezes, é mesmo uma trampa.

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    1. O problema é mesmo esse. Há tanta gente que pede sem precisas que depois quem precisa não tem.
      Eu nunca dou nada a ninguém. Ou são arrumadores que não precisam mas fazem disso profissão porque se ganha bem, ou são romenas. Um vez vi uma a pedir, mas tinha ao seu lado uma caixa de tinta para o cabelo acabadinha de comprar no supermercado em frente.

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  5. Pipocante Irrelevante Delirantesexta-feira, 28 novembro, 2014

    Eu sei que é feio, mas

    E um blog matchy-matchy, a Senhora e a Sua Pobre?
    isso é que era inovar!

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    1. Era, mas vou deixar esse nicho de mercado para as bloggers classe A.

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