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quarta-feira, junho 04, 2014

No meio desta confusão dá para pensar em tudo

Quando era miúda, lembro-me que se contavam anedotas "de judeus".
Eram anedotas como as outras, ora o menino Joãozinho, ora alguém dizia "Otto traz a motosserra", todos ríamos, grande paródia as anedotas de judeus.
Ou as anedotas do Samora Machel, que não passavam de piadas racistas, no entanto eram contadas sem qualquer pudor, por pessoas de qualquer idade.
Há cerca de vinte anos, quando entrei para a faculdade, estavam na moda as anedotas machistas. Ah e tal, "como dás mais liberdade a uma mulher, aumentas-lhe o espaço da cozinha", "quantos neurónios tem uma mulher, quatro, um para cada bico do fogão", ou a pior, "o que dizes a uma mulher com os dois olhos negros, já te avisei duas vezes".
Eu, que até acho que se pode fazer humor sobre (quase) tudo, lembro-me de chorar baba e ranho sentada na beira da cama, atrasada para sair para as aulas, a ler Mila 18, ou o Diário de Anne Frank, e nessa altura, não teria mais que quinze anos,  pensava como é que uma tragédia como a que foi o Holocausto, pode inspirar alguém a fazer algum tipo de graça.
Hoje não sei sobre que se graceja, na verdade, há muito tempo que não oiço anedotas.
Mas acredito que houve uma enorme evolução nas mentalidades, ou tomada de consciência colectiva, ou vergonha, ou medo, e que mesmo que alguém se lembre de fazer uma piada sobre "judeus e nazis", ou sobre "pretos", ou sobre violência doméstica, vai pensar duas vezes antes de o fazer em público, ainda que o público seja um grupo restrito na esplanada do café.
As coisas mudam, os tempos mudam, as vontades mudam, e fico feliz, muito feliz, quando oiço Migalha do Meio a falar-me "daquelas pessoas assim mais castanhas", para se referir a alguém que há trinta, ou mesmo vinte anos,  não passaria de um preto na boca de qualquer criança.

1 comentário:

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